O Bonzinho e o Malvado na Crise Grega – as Falsas Certezas nas Redes Sociais

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São muitas e inestimáveis as lições de ordem política e econômica que o mundo pode tirar da crise grega. Assim caminha a humanidade. Mas, gostaria de dividir com vocês neste post não as questões técnicas, mas um aspecto comportamental típico dos tempos atuais, que chamou minha atenção em meio aos bilhões de euros em jogo: a facilidade e a certeza com que usuários de redes sociais se posicionam, criticam e julgam um fato.

Filha de uma família que valoriza a educação antes de qualquer outro valor, estudei razoalvemente bastante ao longo da vida e continuo a estudar. Dou aulas. Economia e jornalismo são minhas áreas de interesse. Gosto de ler e me informo diariamente pelos mais diversos jornais, revistas e blogs do Brasil e do mundo. Acredito ter alguma consciência crítica. Penso antes de falar.

Qualquer um, antes de emitir opinião sobre a crise grega, em qualquer fórum,  deveria se embasar, procurar argumentos, buscar e filtrar informações e declarações. Ouvir vozes mais liberais, outras menos. Todos têm seus vieses ideológicos, que perpassam pela Economia, uma “ciência mole”, afinal de contas. Não existe neutralidade. Nem neste nem em qualquer assunto.

Castelos de cartas

O lado que se escolhe na Economia – que não é uma ciência exata e não fornece receita pronta –  é parte de uma visão de mundo. O que diferencia uma opinião de um “achismo” são, justamente, os argumentos que constróem esses castelos. Podem ser de tijolos ou de cartas.

Há inúmeros fatores e complicadores no caso grego. São as questões históricas, os riscos sistêmicos, o futuro de um continente, o sofrimento humano, as regras do jogo, a incompetência de governantes e gestores, a ética. Não é fácil elaborar de pronto um pensamento e se posicionar. É leviano. Mesmo para quem está acostumado a isso.

Em campo, Grécia x Alemanha

Como, então, rapidamente, milhões nas redes sociais já estavam do lado do “não” ou do “sim” no referendo grego? “Escolhe logo, você é Grécia ou Alemanha?”, ameaçou um conhecido. Como assim? Estamos falando de futebol? O fato é que, em questão de minutos, acadêmicos, donas de casa, estudantes, engenheiros, médicos, economistas, jornalistas, políticos, comerciantes, designers, arquitetos, dentistas, advogados, aposentados e tantos outros já tinham certezas de suas opiniões econômicas, difundidas aos quatro ventos. Certezas absolutas, inabaláveis.

Essas e outras certezas vêm sendo, ainda, classificadas. Dependendo da sua opinião e do grupo em que você está inserido, será rotulado como um cara bom ou mau. Existe uma necessidade maniqueísta nesse sentido. Não me lembro em que ponto da vida, já faz tempo, deixei de acreditar que capitalistas são todos perversos. Também abandonei o estigma de que apenas deles advém o progresso. E o pessoal da esquerda (falava-se comunistas), são todos bonzinhos e bem intencionados? Não. Comem criancinhas? Também não.

Metamorfose ambulante

Com base nessas pseudo certezas, a gente escuta e lê reais absurdos.  Outro dia, por exemplo, chegou ao meu conhecimento o texto raivoso de um acadêmico afirmando que a culpa de tudo o que está acontecendo de ruim no mundo é da imprensa especializada em economia. Bingo, mais um agente com o selo de vilão. Nas histórias infantis, onde são plantadas as sementes dos valores culturais de uma sociedade, começa-se a questionar, por exemplo, o conceito de “Lobo mau”. Quem assistiu a “Malévola” no cinema percebeu também uma certa confusão dos papéis, antes tão consolidados. Há sempre que existir um culpado?

Desta forma, a certeza é um mal da nossa era, forjada sob forte influência de iluministas e cartesianos. Assim como ter a obrigação de emitir uma opinião o tempo todo. São meras palavras ao vento. Às vezes, a indecisão e o silêncio podem ser um sinal de sabedoria, de que estamos ainda ouvindo, pensando um pouco mais, fazendo conexões mentais, avaliando, enfim, acrescentando, em vez de simplesmente expor “aquela velha opinião formada  sobre tudo”.

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