Regime aos glutões

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Imagine alguns amigos chegando ao restaurante e pedindo uma pizza para “rachar”. Ninguém tem dúvidas que, se forem gulosos, sairão com fome ou vão “brigar” por um pedaço maior do que o do outro.

Nos últimos dias, a temperatura no país se elevou. A crise institucional, entre Senado e STF, as novas delações na Lava-Jato, agora de executivos da Odebrecht (envolvendo políticos do núcleo duro da gestão pemedebista), criaram um ambiente político de enormes dificuldades para o atual governo, que ainda não conseguiu tirar a economia do atoleiro.

A reação do presidente Michel Temer foi cobrar de seus auxiliares econômicos medidas paliativas para voltarmos o mais rápido possível ao crescimento e não ficar na inação, que muitas vezes caracterizou o governo anterior. Assim, a equipe econômica anunciou algumas medidas para reduzir o chamado “custo-Brasil”. As principais delas são: 1) Reformulação nas regras do FGTS; 2) “Refis” remodelado, para ajudar as empresas no refinanciamento de dívidas tributárias; 3) Racionalização da burocracia e 4) Facilitação ao acesso ao crédito, via BNDES, para “oxigenar” pequenos empresários que estão com dificuldades. E virão outras, em breve.

Pari passu a essas medidas, vão tramitando no Congresso as propostas de ajuste fiscal, além da já aprovada PEC do teto. A mais controvertida é a reforma da Previdência, recentemente divulgada pela equipe econômica. Tenho convicção de que será um desafio e tanto aprová-la. A exposição de motivos, como está sendo feita, não convencerá a sociedade da premência da mesma. Filmetes em TV e anúncios em jornais não serão suficientes para que a sociedade aceite se aposentar mais tarde, agora com 65 anos e 25 de contribuição, além de trabalhar 49 para receber integralmente seu benefício.

O ponto que não está sendo enfatizado, a meu juízo, é a “pizza”. Com o fim do bônus demográfico a caminho (a população está envelhecendo e mais pessoas vão pedir suas aposentadorias em um período não muito distante) só a PEC dos gastos não resolverá o desajuste das contas públicas. Em minha análise, daqui a pouco mais de uma década, a previdência, junto com a folha salarial, corresponderá a toda receita do governo. Atualmente, 40% do orçamento federal é consumido pela previdência/assistência social. Mas como todo mundo quer um “tasco” maior da “pizza”, haja “fermento” para fazer a arrecadação crescer.

É óbvio que o tema da previdência desperta paixões, pois afeta o interesse de grande parte dos trabalhadores. Como mencionei acima, minha expectativa é que o Congresso fará muitas alterações na proposta inicial, o que tomará alguns meses de debates. Mas alguns pontos me parecem fundamentais e não devem ser alterados, como a idade mínima para novos entrantes, a equidade entre público e privado e a desvinculação dos benefícios ao salário mínimo.

Em relação à questão de tratamento diferenciado para alguns profissionais, como professores e militares (como é hoje em dia), isso dará pano para manga. Minha sugestão é que se formem grupos de estudos, envolvendo os interessados, para que se estabeleça uma regra “em degraus”, contemplando algumas especificidades. Se assim for, com certeza, enfrentar-se-á menos barreiras na aprovação dessa emenda. O fato é que algo precisa ser feito, caso contrário em breve seremos um país de idosos pobres.

Tenho senões à PEC do teto, como foi aprovada, não por conta da saúde e da educação, onde foram estabelecidos os pisos (e não os tetos) de cada um. O problema é que em algum momento corremos o risco de produzirmos superávits além do necessário, quando o PIB crescer muito mais do que a inflação passada. Todavia, a imposição de um limite de gastos era importante e já deveria ser regra faz tempo. Minha crença, contudo, é que não será suficiente, se continuarmos a ser um país de “glutões”.

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