Reforma Tributária americana: o retorno da Reagonomics?

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O 45º Presidente dos Estados Unidos da América, Donald Trump, apesar do seu recente fracasso na empreitada contra o Affordable Care Act (ObamaCare), enviou ao Congresso os detalhes de seu plano tributário, o mais ousado e polêmico em décadas. Espera-se que essa medida vá ao encontro de suas promessas de campanha, quando o republicano se comparou ao falecido ex-presidente Ronald Reagan. Reagan foi um notável orador, conhecido por suas polêmicas medidas econômicas, que reduziram severamente impostos, investiram substancialmente no setor militar, desregulamentaram boa parte do mercado e reduziram drasticamente os gastos com medidas sociais. Atitudes que, apesar de controversas, auferiram crescimento econômico de 7,3% durante sua administração, superando a ‘’stagflation’’ (estagnação econômica acompanhada de inflação) que o antecedeu, caracterizando a presidência com o segundo melhor ganho econômico da história, atrás somente de Harry S. Truman, cuja gestão usufruiu da onda de bonança econômica pós-Segunda Guerra Mundial.

Em uma tentativa de obter o mesmo resultado com medidas de natureza similar, 33 anos depois, o Presidente Trump apresenta orgulhosamente à população americana seu plano tributário, que elenca os quatro princípios a seguir:

-Simplificar o código tributário e torná-lo justo.

-Aumentar a renda do cidadão americano através de reduções fiscais.

-Tornar os Estados Unidos o imã global para empregos.

-Repatriar trilhões de dólares mantidos no exterior.

Foram esses os principais pontos de parte da sua campanha, que estão sustentando seu atual governo. No entanto, com alguns tópicos do seu projeto explanados ao crivo popular, não faltam críticas às proposições nele contidas nem grandes incongruências com os compromissos assumidos com seu eleitorado e o povo americano.

Visto que no modelo de imposto de renda americano são previstas diversas possibilidades de declaração de renda, dependendo da situação conjugal e financeira dos indivíduos, aqui será abordada a variante de um indivíduo solteiro. Todos os valores aqui contidos são referentes à renda anual.

No que tange à taxação da renda da pessoa física, o modelo anterior apresentava sete categorias de incidência, com alíquota mínima de 10% sobre renda no valor de US$ 9.325 e máxima de 39,6%, incidentes em renda superior a US$ 418.400. Bem como o CTC (Child Tax Credit), um mecanismo de isenção tributária de até US$ 1.000 por cada filho diretamente dependente.

A proposta reduz as sete categorias para três, compreendendo alíquotas de 12%, 25% e 35%, sem especificação de renda para cada categoria, até agora. Juntamente, sustenta o CTC, adicionando uma dedução tributária no valor de US$500 para dependentes sem relação de parentesco. E, ainda, implementa a não cobrança de imposto de renda para indivíduos cuja renda seja inferior a US$ 12.000.

Essa medida vem acompanhada de um perigoso jogo de palavras do presidente estadunidense. De fato, a quarta categoria do modelo atual, a ‘’classe média’’, cuja renda anual está entre US$ 153.100 e US$ 233.350 deixaria de efetuar o pagamento de 28% e passaria a cumprir com a alíquota de 25%. Todavia, a real classe média, averiguada com renda entre US$ 46.960 e US$ 140.900 teria um aumento majoritário de imposto, para 25%. Adicionalmente, a classe mais baixa receberia um aumento de 2% em sua alíquota, e a classe mais alta, uma redução de 4,6%.

Diversos especialistas e comentaristas políticos enxergam essa medida como um contra senso em uma nação com elevadíssimos índices de desigualdade econômica e um governante populista. Fato que dá a entender que o Presidente Trump está atendendo, acima de tudo, aos interesses particulares de seu grupo econômico, afirmação também evidenciada pela abolição do tributo sobre herança e transferência de patrimônio post-mortem.

No tocante à alíquota tributária aplicada a corporações, o plano almeja a alteração da alíquota máxima de 35% para uma única categoria de 20%, abaixo da média global de tributação, que se encontra em 22,5%, juntamente com medidas como a abolição do Alternative Minimum Tax (AMT), um mecanismo cujo propósito é dificultar a evasão fiscal através de desencargos tributários, que cobra 20% de toda renda superior a US$ 40.000.

Com as medidas acima, sem dúvida, os Estados Unidos estariam se tornando uma nação mais competitiva para negócios, apesar da notável superficialidade da proposta, que não aborda tópicos importantíssimos, como ganhos financeiros e de capital. Mas em que nível essa nova competitividade cobra seu preço da população e do orçamento público são as grandes questões.

Apesar do suposto elevado nível de contraditoriedade entre as propostas, existe uma medida que suscitou o maior número de críticas e indagações: a redução do imposto sobre a renda proveniente de pequenos e médios negócios, empresas de responsabilidade individual, sociedades e corporações S para uma alíquota fixa de 25%.

As corporações S são empresas criadas com o intuito de transmitir ganhos, perdas, deduções e crédito para seus acionistas, conhecidas como ”pass-through corporations”. Esse modelo societário-tributário foi criado com a intenção de evitar a dupla taxação. Em vez do tributo da empresa e o da pessoa física, como nas Corporações C, é cobrado, nessa estrutura, somente o da pessoa física na distribuição de renda. Contudo, a proposta consiste em aplicar uma alíquota de empresa fixada em 25% e, para isso, são demandados pré-requisitos específicos, como limite de acionistas, um único tipo de cota societária, obrigatoriamente de cidadania americana, entre outros.

Essa medida é extremamente polêmica, visto que, apesar de existirem muitas empresas pequenas com esse modelo, existem muitas gigantes, como a do próprio presidente, Donald Trump. Isso indica um forte conflito de interesses na questão, conforme previamente citado.

Os mercados reagiram bem à publicidade do plano fiscal republicano, a S&P 500 atingiu uma máxima recorde e as small caps observaram aumento, com manutenção do rally. No entanto, o dólar apresentou uma leve queda, indicando que, apesar da boa percepção para com a proposta de Trump, o mercado está inseguro quanto à manutenção de capital em território americano. A reação veio em bom momento, após a derrota de Trump no Congresso em sua tentativa de destituição do Obamacare, fato que questionou sua capacidade de aprovar projetos de real impacto, uma característica que, alegadamente, lhe garantiu a eleição.

Em suma, o projeto ainda está pouco desenvolvido, diversos pontos não foram abordados e, dos mencionados, poucos estão aprofundados. A reação do mercado foi um bom indicativo, mas a queda do dólar demanda cautela. Então, resta aguardar o desenrolar dos debates e das medidas, sempre atentos.

 


raphaelp7.pngRaphael Póvoas

Membro do Jurídico e Comercial do CEMEC.

 

 

 

 

 

 

 

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