Banco Central da Inglaterra: primeiro aperto em uma década

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A partir de uma votação de 7 contra 2 numa reunião do BoE (Bank of England – Banco Central da Inglaterra) no dia 02 de novembro, a taxa de juro para empréstimos no Reino Unido subiu de 0,25% para 0,50%. Tal aumento na taxa de juro, conhecido como hike, não era visto há uma década, pouco antes de quando os principais bancos centrais ao redor do mundo começaram a estimular a economia a fim de resolver a crise financeira de 2008. Esses incentivos, via política monetária, se baseavam em aumentar a liquidez do mercado comprando ativos insolventes, além de resgate de empresas consideradas pilares para a economia, como os bancos (políticas conhecidas como quantitative easing e bailout, respectivamente).

Apesar do hike ter sido esperado – muito por conta da fala dos membros do BoE -, um elemento que trouxe bastante conflito de ideias entre os integrantes foi o referendo do Brexit (decisão do Reino Unido em sair da União Europeia). Com a população votando pela separação no ano passado, diversas incertezas quanto à economia britânica foram traçadas. Desse modo, a moeda nacional, libra esterlina (GBP), desvalorizou em relação ao euro (EUR), fazendo os produtos importados ficarem mais caros, e as exportações, desestimuladas. Como a Grã-Bretanha produz poucos bens de consumo (focando em prestação de serviços) e, consequentemente, precisa importar mais, consumidores britânicos sofreram um “aperto” salarial, ou seja, seus salários reais diminuíram.

Isto posto, a taxa de inflação britânica encontra-se atualmente em 3% ao ano – bem acima da meta de 2% -, pressionando ainda mais os consumidores. Portanto, visando controlar tal dado, o hike serviria como um estímulo para a população poupar e investir, reduzindo a parcela da renda destinada ao consumo. Todavia, o hike desvalorizou ainda mais o GBP frente ao EUR, tendo em vista uma possível diminuição em empréstimos do setor privado voltados para investimento, com desaceleração devido às incertezas quanto ao Brexit. Entretanto, o BoE se encontra num dilema, onde não se tem certeza se o aumento inflacionário se deu por conta de uma demanda mais robusta ou se foi pela queda da moeda nacional. Vale destacar que tal depreciação monetária fez a bolsa de valores britânica, FTSE100, subir 0,9% no dia.

Além disso, ajustes salariais foram reduzidos, ao passo que o governo britânico se depara com um déficit orçamentário e procura reduzir custos. Apesar de, recentemente, a primeira ministra, Theresa May, ter aumentando salários de servidores públicos, tal elevação continua abaixo da inflação. Quanto ao setor privado, mesmo com a menor taxa de desemprego em 4 anos, trabalhadores estão com pouco poder de barganha, logo também enfrentam salários reais menores.

Levando em consideração tais informações, a minoria dos membros do BoE acredita haver poucos sinais de recuperação de salários e gastos domésticos, enquanto, para a maioria, o contínuo crescimento econômico (cerca de 1,7% ao ano por 3 anos) justifica tal decisão, apesar de estar abaixo dos 2,9% em período pré-crise.

Destacando o setor de serviços – responsável por 80% da economia britânica-, dados mais recentes do PMI do mesmo (índice medidor de condições de negócios) subiram de 53,6 em setembro para 55,6 em outubro, maior patamar desde agosto de 2016. Isso representa uma maior confiança das empresas no crescimento do mercado interno (acima de 50 é considerada expansão; abaixo, uma contração).

Vale ressaltar a atitude do BoE durante a crise de 2008 quanto à taxa de juro interbancária, Libor – baseada no que os bancos comerciais acreditam que serão cobrados por outros ao pegar empréstimos -, referência para hipotecas e empréstimos a clientes comuns. Mesmo com o Banco Central britânico afirmando que a Libor não era regulada no Reino Unido naquela época, há registros do mesmo pressionar bancos comerciais (multados em milhões de dólares) a forçar a taxa para baixo. Devido a isto, a Libor sofreu diversas reformas, mas com uma reputação difícil de ser reconstruída, há planos de substituí-la por uma taxa baseada pela transição efetiva.

Entretanto, em uma declaração à imprensa, HSBC, Barclays, Lloyds Banking Group, entre outros principais bancos, disseram que revisarão as demais variáveis para a taxa sobre hipotecas e poupanças, afirmando não mudar tal índice por enquanto. Todavia, alegaram modificar apenas produtos diretamente ligados à taxa de juro estipulada pelo BoE, diferentemente das mercadorias supracitadas.

 

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Filipe Merian

Membro de Análise Macroeconômica do CEMEC (Centro de Estudos de Mercado de Capitais)

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