A verdadeira magnitude do Florence

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Os entusiastas do mercado, ou da economia propriamente dita, têm ciência de que os Estados Unidos, detentores do título de maior economia do planeta em termos de PIB, desfrutam de um crescimento invejável. Vários fatores, incluindo o estado de pleno emprego, com a taxa de desemprego oscilando por volta da mínima histórica; a inflação sob controle; os maiores investimentos nos negócios e a expectativa de obtenção de lucros corporativos cada vez mais sólidos, impulsionam o crescimento do PIB para cima de 4%, na taxa anualizada. E isso ajuda a dar um tom mais positivo para os mercados financeiros.

Os principais fatores de risco capazes de gerar obstáculos mais significativos para a manutenção da saudável expansão norte-americana se encontram na conturbada relação comercial com a China e a União Europeia, além do desconhecimento acerca dos futuros movimentos de crescimento salarial nos EUA. Caso avancem de maneira mais acelerada que o antecipado, podem fazer com que o FED, o banco central americano, promova um ciclo de elevação nos juros mais agressivo, dada a possibilidade de pressão inflacionária, prejudicando, assim, o humor geral da economia.   

Geograficamente falando, o vasto território dos EUA é localizado em uma região propensa a ser atingida de maneira direta por adversidades climáticas, tais como furacões e tempestades tropicais, causando uma série de complicações sociais, devido à quantidade de pessoas que se tornam desabrigadas em decorrência das fortes chuvas, ventos e transbordamentos de rios.

A mais recente tempestade enfrentada pelos EUA, o furacão Florence, trouxe desordem nos estados das Carolinas, na costa leste do país, com expectativas de futuras tempestades nas próximas semanas, mais ao sul. Em entrevista, o governador do Estado da Carolina do Norte, Roy Cooper, informou que mais de 900 pessoas foram resgatadas de alagamentos e cerca de 15.000 permanecem em abrigos. Do ponto de vista econômico regional, vale ressaltar que a Carolina do Norte é o maior produtor de tabaco dos EUA e, com as tempestades, metade da safra da região leste do Estado deve ser destruída pelos fortes ventos, ocasionando em perdas de centenas de milhares de dólares para fazendeiros locais.

Além das perdas sociais e na economia agrária, é também possível observar os impactos em outros setores econômicos. Considerando que esta não é a primeira vez que os EUA enfrentam tal dificuldade (Irma, Maria, Harvey, Sandy e Katrina), especialistas chegaram à conclusão de que as consequências econômicas negativas existem, contudo raramente têm efeito prolongado. De imediato, observa-se redução nos gastos dos consumidores, afetando, consequentemente, os negócios. Entretanto, como já mencionado, as implicações prejudiciais têm duração de curto prazo, tornando o cenário mais incerto em um intervalo de tempo de dois meses, aproximadamente.

Analisando de maneira mais empírica, é notório o comportamento da economia norte-americana no ano passado, quando foi assolada pelo furacão Harvey. Na situação em questão, houve uma destruição de propriedades no valor de US$ 125 bilhões em Houston, Texas, enquanto a perda na produção econômica ficou em torno de US$ 8,5 bilhões, valor “irrisório” se comparado ao valor total do PIB estadunidense, ao redor dos US$ 19 trilhões. Ademais, no trimestre em que houve o furacão, o crescimento foi de saudáveis 2,8%, com o avanço das folhas de pagamento registrando pífio valor, de apenas 14.000 no mês do fato citado. No mês seguinte, o crescimento atingiu os 271.000. As declarações individuais de desemprego também tiveram breve alta, logo retornando à tendência de baixa para as mínimas históricas, onde atualmente se encontra.

Pesquisas feitas por economistas do FED apontam que os negócios tendem a desacelerar durante e imediatamente após a incidência de desastres naturais. Todavia, uma vez que as atividades de reconstrução das propriedades demolidas ou danificadas começam, nota-se, paralelamente, um avanço nas compras de veículos e no próprio setor de construção. As regiões que foram atingidas pelo furacão Harvey viram suas atividades de comércio, como varejo e restaurantes, terem rápida recuperação. Por motivos óbvios, nem toda economia afetada por uma calamidade natural irá, necessariamente, ter raṕida recuperação, ou mesmo ser capaz de se recuperar totalmente. Cita-se como exemplo, o impacto causado pelo furacão Katrina sobre o Estado de Nova Orleans, em 2005. As perdas na produção econômica e no mercado de trabalho até hoje não encontraram o patamar observado antes do Katrina. Mesmo assim, tais eventos não implicam que a expansão da economia nacional sofrerá desaceleração. Nesse caso do Katrina, por exemplo, o crescimento do PIB estadunidense foi de 3,6% anuais.

Apesar do que foi informado em relação às consequências mínimas da incidência de tais tempestades sobre a economia nacional, essas adversidades costumam gerar confusões em dados estatísticos, tornando mais difícil para os formuladores de política terem a leitura ideal. Isso é comprovado pelo expressivo aumento na compra de veículos, resultado do movimento dos cidadãos para repor os que foram perdidos pela tempestade. Com isso, a taxa de vendas de automóveis e afins tende a ter abrupta queda após certo tempo, uma vez que o massivo aumento reportado anteriormente não teria como se manter estável. Dessa maneira, embora as consequências econômicas de longo prazo sejam ínfimas, especialistas podem demorar mais tempo para desvendar os imbróglios estatísticos do furacão Florence.

 


   Pedro Tonazzi

Membro de Análise Macroeconômica do CEMEC, empresa júnior vinculada ao IBMEC, que tem como proposta principal realizar estudos e pesquisas sobre o mercado financeiro.

 

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