Insuficiência fiscal dos estados brasileiros

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A atual situação das contas públicas e a instabilidade fiscal nas três esferas do governo têm dominado o debate econômico brasileiro. Nos últimos anos, os municípios e estados brasileiros vêm sofrendo com um forte agravamento das suas contas. Seja por má administração ou como consequência da crise econômica, esses entes federativos estão à beira da ruína, principalmente por estarem descumprindo os limites firmados pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Uma prova da péssima situação dos estados brasileiros é que, dos 27 estados da federação, somente 6 irão iniciar o ano de 2019 com as contas públicas consideradas em boas condições.

Como dito anteriormente, o cenário fiscal afeta as três esferas do governo. Entretanto, são nos estados e municípios que a situação é ainda mais grave. Um dos principais problemas é a falta de liquidez, que tem se retratado na insuficiência dos estados em pagar seus funcionários e manter em boas condições os serviços públicos essenciais. Apesar de grave, a falta de liquidez pode ser considerada um problema organizacional, uma vez que não há muita brecha para adequar as despesas dos estados e dos municípios à arrecadação.

Como resultado da dita ausência de liquidez, diversos serviços considerados primordiais, como educação, saúde e segurança, sofrem com a falta de investimentos. No Rio de Janeiro, que decretou estado de calamidade financeira há dois anos, o índice Ideb, que mede a qualidade do ensino nos estados, sofreu retração se equiparado ao último e não atingiu as metas estabelecidas. Já na saúde, algumas UPAs foram fechadas devido à crise na segurança, e outros centros de saúde sofrem com a escassez de verba.

Para se ter uma ideia, a dívida dos estados e municípios com a União chegou a atingir R$ 908 bi em 2017, segundo dados contidos no documento Exposição da União à Insolvência dos Entes Subnacionais. Esse expressivo número deriva principalmente do aumento dos gastos obrigatórios, como, por exemplo, os gastos com pessoal, que tendem a crescer cada vez mais. Essa tendência de crescimento vem a afetar o funcionamento dos serviços básicos dos estados, como pode ser percebido nos estados de Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, que atingiram as piores posições no ranking de situação fiscal.

Dessa forma, as despesas com inativos e pensionistas é um revés às contas públicas estaduais, uma vez que o tamanho das contribuições não se contrapõe ao de benefícios. Em 2017, o déficit das previdências estaduais chegou a ultrapassar R$ 93 bi, de acordo com arquivos do Tesouro Nacional, superando inclusive os gastos com saúde. Se comparado com 2011, quando o déficit alcançou R$ 24,6 bi, o rombo quase que quadruplicou. De setembro de 2017 a agosto de 2018, conforme exposto pelo Portal Transparência do governo do estado do Rio de Janeiro, os gastos com a folha salarial do Poder Executivo ficaram em 46,7% da Receita Corrente Líquida (RCL), e a soma dos Poderes em 55,7% da RCL, abaixo dos 60% permitidos, antes da reforma, na LRF.

Um estudo do Tesouro Nacional salienta que as medidas de precaução tomadas até o momento representam uma atenuação do problema no curto prazo. Entretanto, no médio a longo prazo é prevista a  acentuação do desequilíbrio fiscal. O governo federal, para minimizar o risco de inadimplência, recorreu a algumas mudanças, como renegociar a dívida e reformular o Sistema de Garantias da União. A primeira, através da redução de taxas de juros e aumento do prazo de pagamento, proveu certo alívio aos entes. Na segunda medida, entre as mudanças, está a limitação para contratação de operações de crédito e novas regras de governança.

Em uma tentativa de amenizar a situação fiscal dos municípios, o então presidente da República em exercício, Rodrigo Maia, na ausência do presidente Michel Temer, sancionou uma lei complementar para afrouxar a atual LRF. O texto, que já havia sido aprovado na Câmara e no Senado, permite que os municípios recebam transferências voluntárias e contratem novas operações de crédito mesmo que os gastos com pessoal sejam maiores que os permitidos na lei. Essa medida possibilita que ao menos um terço dos municípios brasileiros descumpram as exigências.

A partir dessa análise, é possível deduzir os principais problemas envoltos na insuficiência fiscal dos estados. O alto grau de comprometimento orçamentário dos estados com gastos com pessoal, que está interligado ao déficit previdenciário, é o principal problema. Junto a isso, está a rigidez orçamentária, que compromete os investimentos e tornam as contas públicas suscetíveis aos ciclos econômicos. Uma evidência disso é a liquidez existente, resultado do exagerado uso de restos a pagar sem garantia de pagamento. Dessa forma, a melhor maneira de sair do atual estado de crise está vinculada a intervenções que visem atacar esses obstáculos. Assim, é necessário aumentar o poder de reação dos atuais gestores a mudanças no cenário econômico, de forma a combater a rigidez orçamentária e debater as prioridades de alocação dos tributos arrecadados.

 

maria-mesquita.pngMaria Mesquita

Membro de Análise Macroeconômica do CEMEC, empresa júnior vinculada ao IBMEC, que tem como proposta principal realizar estudos e pesquisas sobre o mercado financeiro.

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