As lições de uma Espanha pós-recessão

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A Espanha, uma das economias mundiais mais afetadas pela crise de 2008, é exemplo de um país que, através da adoção de uma série de reformas e medidas estruturais, conseguiu se reestabelecer e retomar as rédeas de seu crescimento, reduzindo gastos públicos, simplificando impostos e aumentando a produtividade.

A nação ibérica, que vinha colhendo os frutos da introdução do euro como moeda oficial, passou por um longo período de prosperidade econômica, com a facilidade na aquisição de crédito e hipotecas, com pouco incentivo do governo à poupança das famílias. Por consequência, os anos que antecederam 2008 foram marcados pelo aumento das dívidas do setor privado, vide o processo semelhante ao estadunidense para o pagamento dos créditos hipotecários.

Com o advento da crise externa e o desequilíbrio nas contas públicas internas, a Espanha se viu diante de uma grave recessão, que culminou na redução de quase 10% de seu produto interno bruto e no impressionante aumento na dívida pública, além da exorbitante taxa de desemprego, que chegou a 26%, o dobro da média da União Europeia. Como o país havia aderido ao euro, não havia a possibilidade de utilizar a desvalorização do câmbio como instrumento de política econômica, o que prejudicou a tentativa de aumentar o volume de exportações, uma das poucas maneiras possíveis de se sair da crise.

Em 2013, a potência europeia conseguiu finalmente dar sinais da sua reestruturação, após o empréstimo de 100 bilhões de euros da União Europeia e a adoção de uma agenda econômica mais austera, que promoveu maior eficiência ao setor público. O corte de gastos da máquina estatal (como a redução de 17% do orçamento dos ministérios) e o congelamento nos aumentos salariais do funcionalismo público foram as primeiras medidas realizadas pelo então primeiro-ministro Mariano Rajoy, ocasionando uma queda no déficit do governo central, que era 7% do PIB em 2012 e chegou a 3% em 2017. Além dos cortes, a realização de uma reforma tributária simplificou o IVA, imposto aplicado sobre bens e serviços, o que diminui a burocracia em seu pagamento.

A reforma trabalhista, também realizada por Rajoy e de cunho muito similar à realizada pelo ex-presidente Michel Temer em 2017, resultou em uma diminuição significativa nas multas em caso de demissão sem justa causa, o que promoveu a criação e a manutenção de pequenas e médias empresas, antes assoladas por essas taxas. A flexibilização das leis trabalhistas também auxiliou no desenvolvimento do setor de manufaturas espanhol, que cresce continuamente desde 2013. O setor bancário, que se encontrava dividido entre pequenas unidades regionais, foi financiado com recursos da União Europeia, além dos incentivos à compra de diversas instituições por bancos de grande porte, a fim de diminuir os riscos de insolvência.

E, como outro fator importante, grande parte dos recursos foram utilizados de modo a pautar a Espanha em um modelo de crescimento definido pela exportação de bens e serviços, o que diminuiu os custos de se fazer negócio no país. Em 2017, foram arrecadados 400 bilhões de euros com exportações, 60% acima do que o país exportava antes da crise.  Assim, a sua recuperação se deu com força maior do que a de seus vizinhos, como Portugal, com o crescimento de seu PIB superando a média da UE.

Entretanto, o país apresenta ainda alguns resquícios da crise, marcados na sociedade, como a alta taxa de desemprego, que se configura em 13,9% atualmente, e a presença de uma significativa burocracia estatal, que prejudica a abertura e a realização de negócios. A Espanha, que hoje figura em 30º lugar no índice Doing Business, que mede a facilidade de se fazer negócios, está muito à frente de países como o Brasil, mas apresenta um longo caminho pela frente para alcançar outras potências europeias. 

Um ponto interessante do caso espanhol foi o fato de a retomada da economia acompanhar um enxugamento no tamanho do Estado, onde os gastos com a máquina pública eram responsáveis pelo consumo de 48% do PIB em meados de 2013, e hoje são pouco mais de 40%, frente a 43% de países como a Alemanha. 

Deste modo, com o crescimento rítmico do PIB, o aumento no volume de exportações, a expansão do setor de manufaturados e a retomada do mercado imobiliário, a nação hispânica mostra ter superado sua severa crise, com suas reformas estruturais e seus cortes de gastos no setor público servindo de exemplo para outras nações.

 

img-cemec João Pedro Werberich

Membro de Análise Macroeconômica do CEMEC, empresa júnior vinculada ao IBMEC, que tem como proposta principal realizar estudos e pesquisas sobre o mercado financeiro.

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3 Comentários

  1. Acaba de ganhar mais um fã Jõao Werberich! Texto sensacional, muito abrangente e explicativo fico no aguardo de mais material seu!

  2. Texto sensacional! Fico no aguardo de mais material do Jõao Werberich, artigo muito bem construído e com fontes sólidas parabens essa é a verdade que muitos nao tem coragem de admitir!

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